Ministro Gilberto Gil estuda pedido para transformar o ayahuasca em bem imaterial da humanidade...
As comunidades religiosas que fazem uso do chá ayahuasca durante as celebrações esperam comemorar em breve o registro da substância como patrimônio imaterial da humanidade, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). O ministro Gilberto Gil recebeu o pedido dos religiosos no início do mês e agora o processo deve passar pelo Conselho Consultivo do Iphan.
Na última semana, o instituto considerou patrimônio imaterial o modo artesanal de fazer o queijo-de-minas. O samba e o frevo também foram reconhecidos. Na mesma linha do chá ayahuasca, já são bens da humanidade, por integrarem cerimônias religiosas, o Círio de Nossa Senhora de Nazaré – uma celebração de fé em Belém, no Pará – e o Jongo do Sudeste, que envolve canto, dança e tambores com o objetivo de atualizar as crenças nos ancestrais.
O reconhecimento do chá, usado nas celebrações do Santo Daime (nome que designa tanto a bebida como o culto), será um ganho para a sociedade, segundo os daimistas, porque o ritual passará a ser tratado com mais respeito. No Nordeste e Norte do país, qualquer um conhece o Santo Daime. O problema é que em outras regiões do Brasil, pelo desconhecimento, os daimistas dizem que ainda sofrem com o preconceito.
O antropólogo da Universidade Federal da Bahia, Edward Macrae, lembra que, acima de qualquer polêmica em relação ao chá, pelo fato de ele ser considerado uma substância psicoativa, a questão histórica é a de maior importância. O chá ayahuasca se confunde com a colonização e a urbanização do Acre. O fundador da religião, conhecido como Mestre Irineu, teve a primeira experiência com o ayahuasca na floresta, junto aos índios, mas desenvolveu o culto na cidade. “A religião é influenciada pelo catolicismo popular. O mestre cristianizou a prática indígena e organizou a doutrina”, explica Macrae.
Segundo os pesquisadores, o Santo Daime serviu como instrumento de integração de uma população desorientada. Na época do colapso da economia da borracha, os seringueiros saíram da floresta e foram para as comunidades, na periferia. Por meio do chá e do ritual é que eles conseguiram se unir e se adaptar à vida urbana.
O ritual
Foi somente na década de 70, após a morte do Mestre Irineu, que a doutrina do Santo Daime começou a se expandir pelo resto do mundo, nas mãos do padrinho Sebastião. No Paraná, o ritual é novo. Curitiba não tem igreja oficial. Há apenas duas na região metropolitana: uma em Pinhais e outra em Campo Magro. E elas não têm mais de seis anos.
No fim de semana passado, cerca de 100 daimistas se encontraram para comemorar o Dia das Mães, na igreja Céu do Paraná, em Campo Magro. Logo na chegada, percebe-se o capricho dos adeptos: as roupas usadas, que eles chamam de fardas, são brancas e simbolizam o compromisso assumido com a religião. As mulheres usam saia e uma coroa na cabeça; os homens usam terno branco e gravata preta, roupas em homenagem à Rainha Mãe. As orações começam com o terço. Depois de um pequeno intervalo, anuncia-se o despacho do Santo Daime. Homens de um lado e mulheres de outro. É assim até o final: é o lado positivo e negativo, as energias precisam circular. Demora cerca de 30 minutos para que o chá, servido em pequenos copos de vidro, comece a fazer efeito. Com a mazurca na mão, espécie de um chocalho, homens e mulheres começam a dançar e cantar o que eles chamam de hinários. Parecem danças indígenas, embaladas também por sanfona e violão. Os fiéis dizem que a experiência é interior, íntima e discreta. “Cada um sente o chá de uma forma. E com o passar do tempo, as sensações mudam”, explica a fardada Maria Lucia Shelpauer. “Sinto um vigor físico. Sinto minha consciência se expandindo e vejo mirações”, diz a daimista Beatriz Kawall. O chá provoca visões e, segundo a crença, conecta o homem ao ser espiritual. A celebração dura cerca de cinco horas e o ayahuasca é servido três vezes. Fogos de artifício são lançados durante a noite toda: em memória ao Mestre Irineu, que atirava com uma espingarda, no meio da floresta, sempre que recebia a doutrina e sentia medo.
Depois do segundo despacho do chá, alguns fardados se sentam, outros adormecem e há os que começam a limpeza, que pode resultar em vômitos ou diarréia. Os daimistas acreditam que o chá tem o poder de cura, por isso eles dizem que quem está intoxicado (com drogas, álcool e cigarro) ou tem problemas de saúde, pode receber a cura espiritual do ayahuasca. O trabalho só termina quando ninguém mais está sob o efeito do Daime.
Na última semana, o instituto considerou patrimônio imaterial o modo artesanal de fazer o queijo-de-minas. O samba e o frevo também foram reconhecidos. Na mesma linha do chá ayahuasca, já são bens da humanidade, por integrarem cerimônias religiosas, o Círio de Nossa Senhora de Nazaré – uma celebração de fé em Belém, no Pará – e o Jongo do Sudeste, que envolve canto, dança e tambores com o objetivo de atualizar as crenças nos ancestrais.
O reconhecimento do chá, usado nas celebrações do Santo Daime (nome que designa tanto a bebida como o culto), será um ganho para a sociedade, segundo os daimistas, porque o ritual passará a ser tratado com mais respeito. No Nordeste e Norte do país, qualquer um conhece o Santo Daime. O problema é que em outras regiões do Brasil, pelo desconhecimento, os daimistas dizem que ainda sofrem com o preconceito.
O antropólogo da Universidade Federal da Bahia, Edward Macrae, lembra que, acima de qualquer polêmica em relação ao chá, pelo fato de ele ser considerado uma substância psicoativa, a questão histórica é a de maior importância. O chá ayahuasca se confunde com a colonização e a urbanização do Acre. O fundador da religião, conhecido como Mestre Irineu, teve a primeira experiência com o ayahuasca na floresta, junto aos índios, mas desenvolveu o culto na cidade. “A religião é influenciada pelo catolicismo popular. O mestre cristianizou a prática indígena e organizou a doutrina”, explica Macrae.
Segundo os pesquisadores, o Santo Daime serviu como instrumento de integração de uma população desorientada. Na época do colapso da economia da borracha, os seringueiros saíram da floresta e foram para as comunidades, na periferia. Por meio do chá e do ritual é que eles conseguiram se unir e se adaptar à vida urbana.
O ritual
Foi somente na década de 70, após a morte do Mestre Irineu, que a doutrina do Santo Daime começou a se expandir pelo resto do mundo, nas mãos do padrinho Sebastião. No Paraná, o ritual é novo. Curitiba não tem igreja oficial. Há apenas duas na região metropolitana: uma em Pinhais e outra em Campo Magro. E elas não têm mais de seis anos.
No fim de semana passado, cerca de 100 daimistas se encontraram para comemorar o Dia das Mães, na igreja Céu do Paraná, em Campo Magro. Logo na chegada, percebe-se o capricho dos adeptos: as roupas usadas, que eles chamam de fardas, são brancas e simbolizam o compromisso assumido com a religião. As mulheres usam saia e uma coroa na cabeça; os homens usam terno branco e gravata preta, roupas em homenagem à Rainha Mãe. As orações começam com o terço. Depois de um pequeno intervalo, anuncia-se o despacho do Santo Daime. Homens de um lado e mulheres de outro. É assim até o final: é o lado positivo e negativo, as energias precisam circular. Demora cerca de 30 minutos para que o chá, servido em pequenos copos de vidro, comece a fazer efeito. Com a mazurca na mão, espécie de um chocalho, homens e mulheres começam a dançar e cantar o que eles chamam de hinários. Parecem danças indígenas, embaladas também por sanfona e violão. Os fiéis dizem que a experiência é interior, íntima e discreta. “Cada um sente o chá de uma forma. E com o passar do tempo, as sensações mudam”, explica a fardada Maria Lucia Shelpauer. “Sinto um vigor físico. Sinto minha consciência se expandindo e vejo mirações”, diz a daimista Beatriz Kawall. O chá provoca visões e, segundo a crença, conecta o homem ao ser espiritual. A celebração dura cerca de cinco horas e o ayahuasca é servido três vezes. Fogos de artifício são lançados durante a noite toda: em memória ao Mestre Irineu, que atirava com uma espingarda, no meio da floresta, sempre que recebia a doutrina e sentia medo.
Depois do segundo despacho do chá, alguns fardados se sentam, outros adormecem e há os que começam a limpeza, que pode resultar em vômitos ou diarréia. Os daimistas acreditam que o chá tem o poder de cura, por isso eles dizem que quem está intoxicado (com drogas, álcool e cigarro) ou tem problemas de saúde, pode receber a cura espiritual do ayahuasca. O trabalho só termina quando ninguém mais está sob o efeito do Daime.